O alcoolismo é um dos
maiores inimigos da criatura humana. É de lamentar-se que o seu uso seja tão
generalizado e, infelizmente, haja adquirido status na sociedade. As reuniões,
as celebrações e festividades outras, sempre se fazem acompanhar de bebidas alcoólicas,
responsáveis por incontáveis danos ao organismo humano, à sociedade.
Acidentes terríveis,
agressões absurdas, atitudes ignóbeis decorrem do seu uso, além dos vários
prejuízos orgânicos, emocionais e mentais que acarretam. Verdadeiras legiões de
vítimas se movimentam pelas avenidas do mundo, como enxameiam nos campos,
permanecem nos tugúrios da miséria ou nas celas sombrias dos cárceres e dos
hospitais, apresentando o triste espetáculo da decadência humana. Milhões de
lares sofrem os infelizes lances da sua crueldade. No inquietante momento em
que o uso das drogas é responsabilizado pela vigência de inumeráveis crimes
hediondos, e se levantam muitas vozes em protesto, buscando encontrar as causas
sociológicas, psicológicas e outras, para explicar a avalanche sempre crescente
e assustadora de viciados, urge que se estudem também os problemas do
alcoolismo e suas consequências, não menos alarmantes.
O alcoolismo, ou a
dependência do uso exagerado de bebidas alcoólicas, constitui-se um grave
problema médico, em face dos danos que causa ao organismo do indivíduo e ao
grupo social no qual este se movimenta. Sua gravidade pode ser considerada pelo
número dos internados em hospitais psiquiátricos com desequilíbrios
expressivos. As recidivas, após o cuidadoso tratamento, são numerosas, não se
considerando que as suas vítimas ultrapassam em grande número as outras
toxicomanias.
Na antiguidade, o uso de
bebidas alcoólicas tornou-se comum e quase elegante, caracterizando uma forma
ou de fuga ante os desafios. Acreditava-se, no passado, que o álcool e seus
derivados diminuíam as angústias e tensões, posteriormente se afirmando ou se
justificando possuírem propriedades fisiológicas, produzindo estímulo e vigor
orgânicos.
O alcoolismo decorre de
muitos fatores, entre os quais a personalidade e a tolerância do organismo do
paciente, variando com a idade, o sexo, hereditariedade, hábitos e costumes,
constituição e disposição orgânica. Pode ser resultado de causas ocasionais,
secundárias, psicóticas e conflituosidade neurótica. Experiências ocasionais,
uso após problemas de natureza orgânica e mental – como na epilepsia, na
arteriosclerose cerebral -, compulsão pela hereditariedade e o condicionamento
após o hábito, resultando na conflituosidade neurótica. No começo, o indivíduo
pode experimentar euforia, dinamismo motor, porém vai perdendo o controle, o
senso crítico, tornando-se inconveniente. Com o tempo, surgem outros distúrbios
orgânicos, tais as náuseas, os vômitos, a incontinência urinária e, por fim, o
sono comatoso, no estado mais avançado. À medida que a dependência aumenta e o
uso se faz mais frequente, a bebida alcoólica afeta o sistema nervoso, o trato
digestivo, o aparelho cardiovascular.
As complicações que
degeneram em gastrite e cirrose hepática são inevitáveis, levando à morte, qual
sucede no câncer do esôfago e do estômago. Do ponto de vista psíquico, o
alcoólatra muda completamente o comportamento, e suas reações mentais são
alteradas, a começar pelos prejuízos de memória, a culminar no delirium tremens,
sem retorno ao equilíbrio…
O alcoolismo
(alcoolofilia) é, portanto, uma enfermidade que exige cuidadoso tratamento
psiquiátrico. No entanto, porque ao desencarnar o alcoólatra não morre,
permanecendo vitimado pelos vícios, quase sempre busca sintonia com
personalidades frágeis ou temperamentos rudes, violentos, na Terra, deles se
utilizando em processo obsessivo para dar prosseguimento ao infame consumo de
álcool, agora aspirando-lhe os vapores e beneficiando-se da ingestão realizada
pelo seu parceiro-vítima, que mais rapidamente se exaure.
Torna-se uma obsessão
muito difícil de ser atendida convenientemente, considerando-se a perfeita
identificação de interesses e prazeres entre o hóspede e o seu anfitrião.
Manoel Philomeno de Miranda
(Médico; Escritor;
Conferencista. – Brasil: 1876-1942) Reflexão da série: M. Philomeno Miranda
Fonte: Trilhas da Libertação
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