“Trinta e oito”, chamou
Marisa, a Cambone que organizava a entrada para as consultas. Era a vez de
Jaime.
O homem entrou, saudou o
Caboclo e já ia começar a falar quando a entidade pediu que aguardasse primeiro
o passe.
Enquanto “limpava” o
consulente, o Caboclo notava energias densas, especialmente sobre o Chakra
Frontal. Mas, com atenção e paciência, ia reequilibrando as energias do moço.
Paciência que Jaime não
tinha muito no momento. Queria começar logo a falar e resolver o assunto. Mas,
por um misto de respeito e temor, aguardou a finalização do trabalho.
“O que está acontecendo
filho?” – perguntou o Caboclo.
Essa era a deixa que Jaime
precisava. Agora poderia falar tudo aquilo que passara o dia ensaiando em sua
angústia.
“Olha, seu Caboclo, eu
preciso que o senhor resolva de uma vez o meu problema. Já faz quatro meses que
eu venho aqui todas as semanas. Eu não falto. Faço tudo o que me mandam. Já
tomei banho de ervas, coloquei uma Espada de São Jorge na entrada da minha
casa. Até uma oferenda eu já fiz. Mas, nada acontece!”
“Continuo desempregado. As
portas não se abrem. A vida parece que não anda. Não aguento mais, Seu Caboclo.
Preciso que o senhor dê um jeito nisso. Preciso que o senhor me arrume um
emprego”, finalizou Jaime.
Sensibilizado com a dor e
a angústia de Jaime, o Caboclo depositou um olhar brando sobre o homem. Podia
perceber naquele momento os sentimentos de medo, fracasso e desespero que
tocavam a alma do rapaz.
Mas, acima de tudo, o
Caboclo entendia a necessidade daquela dor. E sabia que havia uma diferença
entra aquilo que o Jaime queria e aquilo que ele precisava. Por isso, em tom
acolhedor, mas com firmeza na voz o Caboclo perguntou:
“Moço, o senhor sempre foi
acolhido com respeito e carinho nessa casa”?
Jaime, apesar de não
entender a pergunta, assentiu que sim com a cabeça.
“E o que os Guias têm
falado para o senhor aqui”?
Ainda confuso com as
perguntas, Jaime respondeu: “Para eu ter confiança, para não desistir de lutar
e para ter paciência”.
Jaime já ia falar que
estava lutando e se esforçando para arrumar um emprego, mas antes que o homem
continuasse, o Caboclo ainda perguntou: “Filho, alguma vez, algum Guia te falou
que ia arrumar um emprego para você? Algum Guia falou para você ficar parado
esperando que Ele que iria abrir as portas para você”?
Agora, um tanto sem graça,
Jaime respondeu timidamente: “Não senhor, seu Caboclo. O que eu sempre ouvi
aqui foi que as coisas aconteceriam no tempo certo”.
“Pois é isso, filho. Assim
é a Umbanda. Um lugar onde as pessoas são recebidas com acolhimento e respeito,
independente de cor, religião, classe social ou preferências sexuais. Um lugar
para os filhos se fortalecerem emocionalmente e encontrarem as forças para
lutar cada batalha da vida”.
“Na Umbanda, o milagre
acontece de dentro para fora e não de fora para dentro. O papel dos Guias de
Lei é ajudar os filhos a resolverem os seus problemas e não resolver os
problemas para eles”.
“Quando é de merecimento, amparados
pela Lei Maior e pela Justiça Divina, os Guias, através da magia, movimentam as
Forças da Natureza para ajudar os filhos na caminhada. Mas, para tudo existe
algo indispensável: o Tempo”.
“Cada coisa acontece no
seu tempo. No tempo do Pai e não no tempo que queremos que as coisas aconteçam.
Assim é a Lei.”
Nesse momento, Jaime já
estava muito mais tranquilo. Dentro dele, a voz de sua consciência reconhecia a
verdade nas palavras do Caboclo. O homem ansioso da chegada, agora até esboçava
um sorriso.
Jaime não podia ver, mas
agora as suas energias estavam equilibradas. Ele estava de novo pronto para
enfrentar as suas batalhas. Fortalecido para enfrentar os seus próprios medos e
seguir renovado em sua autoconfiança.
Em reverência, beijou as
mãos do Caboclo e agradeceu com um sorriso antes de sair.
O Caboclo com seu
semblante sério e firme também sorria por dentro. Estava feliz com aquela
conversa. Tinha cumprido a sua missão. Feito o que um Guia deve fazer: ajudado
o filho em sua compreensão espiritual. Tinha trabalhado como instrumento da Lei
Maior e da Justiça Divina.
Em instantes, o Caboclo
iniciaria um novo atendimento. Mas, ainda pôde ver um Guardião de Ogum ao lado
do filho que ia saindo do Congá. Novamente sorriu por dentro.
Os caminhos materiais do
homem estavam abertos. Jaime, por fim, tinha compreendido a lição que a vida
estava lhe trazendo. Ao chamar para si a responsabilidade pelos seus
resultados, saindo da vitimização, abriu caminho para que as Forças da Natureza
atuassem em seu favor.
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