Oração a São Jorge
Eu andarei vestido e armado com as armas de São Jorge para que meus inimigos, tendo pés não me alcancem, tendo mãos não me peguem, tendo olhos não me vejam, e nem em pensamentos eles possam me fazer mal.
Armas de fogo o meu corpo não alcançarão, facas e lanças se quebrem sem o meu corpo tocar, cordas e correntes se arrebentem sem o meu corpo amarrar.
Jesus Cristo, me proteja e me defenda com o poder de sua santa e divina graça, Virgem de Nazaré, me cubra com o seu manto sagrado e divino, protegendo-me em todas as minhas dores e aflições, e Deus, com sua divina misericórdia e grande poder, seja meu defensor contra as maldades e perseguições dos meu inimigos.
Glorioso São Jorge, em nome de Deus, estenda-me o seu escudo e as suas poderosas armas, defendendo-me com a sua força e com a sua grandeza, e que debaixo das patas de seu fiel ginete meus inimigos fiquem humildes e submissos a vós. Assim seja com o poder de Deus, de Jesus e da falange do Divino Espírito Santo.
São Jorge Rogai por Nós.
São Jorge sempre
despertou nos mais variados povos da Antiguidade, e ainda hoje, o fascínio de
uma divindade que mesclava a força, a energia criativa, à proteção do
guerreiro, daquele que traz consigo o
poder da terra e dos veios ferrosos. O ferro, enquanto matéria prima
imprescindível para a confecção das armas que manteriam determinada sociedade
em condições de lutar pela sua sobrevivência, associou-se a vários outros
símbolos que culminaram por forjar o famoso “Santo Guerreiro”. O povo
brasileiro, muito associado ao Santo em questão, possui a mestiçagem de
ancestrais que de alguma forma estiveram em contato com o vasto simbolismo que
São Jorge nos ensina: a força da terra, com suas matas e grutas em pedra; a
guerra e o cavaleiro; o ferro e a forja no fogo; um alfabeto mágico; o dragão e
os veios energéticos que marcam os terrenos das sociedades. O São Jorge que ora
se apresenta nestas linhas é a tentativa de mostrar o elo entre muitas
culturas, inúmeros simbolismos, mesmo arquétipos que uniram povos desde o norte
da Europa até os nossos ancestrais portugueses e africanos. Esse é o caso da
aproximação realizada nos rituais umbandistas, em território brasileiro, entre
o santo católico e o Orixá Ogum.
Lenda ou história? A
versão popular
Por volta do final do
século III, São Jorge teria nascido na região da Capadócia, atual Turquia.
Ainda criança perdeu o seu pai, e sua mãe o levou para a Palestina, educando-o
para a carreira militar. Sua dedicação e habilidade levaram o imperador
Diocleciano a lhe conferir o título de Tribuno. Jorge torna-se cristão, mas com
a idade de vinte e três anos passou a residir na corte imperial romana,
exercendo altas funções.
Em determinado momento o
Imperador Diocleciano planejou matar todos os cristãos que poderiam ameaçar o
poder em seu Império. No dia marcado para o Senado confirmar o decreto
imperial, Jorge levantou-se na assembleia e declarou-se contra aquela decisão.
Defendeu com tanta força a
sua fé que provocou a ira do Imperador, que tentou fazê-lo desistir de suas
ideias, chegando até a tortura. Era periodicamente levado a Diocleciano, que exigia
a Jorge que renegasse a sua fé, o que não aconteceu. O Imperador, não tendo
êxito, mandou degolar o mártir cristão no dia 23 de abril de 303 d.C., sendo
este o dia dedicado a São Jorge.
São Jorge em Portugal e na
Inglaterra
A importância de São Jorge
é tamanha entre os portugueses que a influência do Santo Guerreiro surge ligada
às armas através do sincretismo cristão, séculos após os primeiros povos celtas
terem habitado as terras lusas. Algumas fortificações medievais e posteriores possuem
ainda o seu nome, o que aumentou ainda mais o sincretismo de São Jorge com a
arte da guerra e da vitória sobre os inimigos da fé e da soberania de uma
nação. O primeiro bastião que não pode ser esquecido é o Castelo de São Jorge,
talvez o mais famoso deles, localizado em uma das colinas de Lisboa e
construído, provavelmente, no século II a.C..
Quando da Reconquista
cristã as forças de D. Afonso Henriques (1112-1185), com o auxílio de vários
povos cruzados (principalmente normandos, flamengos, alemães e ingleses) que se
dirigiam à Terra Santa, investiu contra esta que era uma fortificação muçulmana,
que acabou capitulando em 1147 após um cerco de três meses. Provavelmente, sob
a influência da cultura das ilhas da Bretanha, já presente nas terras
portuguesas ancestralmente, e fortalecidas pelo contato intercultural das
Cruzadas, a devoção a São Jorge estabelece-se em Portugal de vez. Após a
vitória o castelo em Lisboa foi colocado, por gratidão, sob a proteção do
mártir São Jorge, a quem muitos cruzados na época já dedicavam forte devoção. O
dia da conquista, 25 de Outubro, passou a ser o Dia do Exército em Portugal,
sendo esta uma instituição que possui São Jorge como padroeiro.
Poucas décadas mais tarde,
entre 1179 e 1183, o castelo ainda resistiu com sucesso às forças muçulmanas
que assolaram a região entre Lisboa e Santarém. E foi no reinado de D. Afonso
IV (1291-1357), chamado de “o Bravo”, que o uso do grito de guerra “São Jorge”
se tornou regra, substituindo o grito anterior dos portugueses que era
“Santiago”. D. Nuno Álvares Pereira (1360-1431) considerou São Jorge o
responsável pela famosa vitória portuguesa na batalha de Aljubarrota . Como o
Rei D. João I de Portugal também era devoto do santo, substituiu São Jorge a
Santiago como patrono de Portugal. Em 1387, D. João I ordenou que a imagem do
santo, montado a cavalo, fosse transportada na procissão católica do corpo de
Cristo. Assim, séculos mais tarde, essa imagem também chegaria ao Brasil.
Curiosamente, o cavalo era
um animal nobre entre os celtas, justamente por ser um servidor dos homens nas
guerras. Viriam de outro mundo oculto, e eram tidos como possuidores de
inteligência humana. Após a morte do herói ou do cavaleiro, retornaria para esse
outro mundo superior, e com isso passaram a ser vistos também como condutores
das almas.
Há, também, o Castelo de
São Jorge da Mina, também designado por Castelo da Mina, ou Feitoria da Mina, e
posteriormente chamado por Fortaleza de São Jorge da Mina. Localiza-se na atual
cidade de Elmina, Gana, litoral da África Ocidental. A “Mina” já funcionava em meados
do século XV, e teve a função inicial de assegurar a soberania e o comércio de Portugal
no Golfo da Guiné, constituindo-se no seu principal estabelecimento na costa africana,
fonte da riqueza que alimentou a economia do país até se iniciar o ciclo da
Índia após a viagem de Vasco da Gama em 1498.
A Inglaterra, aliada
histórica dos portugueses, foi o país ocidental onde a devoção ao santo teve
papel mais relevante. O monarca Eduardo III colocou sob a proteção de São Jorge
a Ordem da Jarreteira, fundada por ele em 1330, pois a imagem de santo
guerreiro, ligado às espadas, já existia. Por considerá-lo a imagem perfeita
dos cavaleiros medievais, o rei inglês Ricardo I, comandante de uma das
Cruzadas, constituiu São Jorge padroeiro daquelas expedições que tentavam
conquistar a Terra Santa aos muçulmanos.
No século XIII, a
Inglaterra já celebrava o nome de São Jorge, e em 1348 surge a Ordem dos
Cavaleiros de São Jorge. Os ingleses adotaram definitivamente São Jorge como padroeiro
do país, trazendo também a sua cruz vermelha (cor do sangue, do fogo e do sacrifício
pelas grandes causas) na bandeira de fundo branco (cor da pureza).
Ogum e São Jorge:
sincretismo, dimensões simbólicas e arquetípicas Filho de Iemanjá, Ogum tem sua
importância destacada pela ligação com os metais, principalmente o ferro,
matéria-prima básica para os instrumentos utilizados por caçadores e agricultores.
É associado atualmente à metalurgia e à siderurgia, representando, dentro do panteão
africano, um símbolo da Revolução Industrial. Não é a toa que muitas das
oferendas à Ogum são realizadas em ferrovias, simbolizando a abertura dos
caminhos diante do elemento ferro17. Este elemento simboliza a transformação,
já que as ferramentas em ferro se tornam úteis (interação) à produção no
momento em que são forjadas em altas temperaturas (o fogo simbolizando o
potencial criativo da mente). O ferro, portanto, é o símbolo dos objetos que servem
aos seres humanos, tornando-os produtivos à sociedade e salvando-os do mal,
fato que pode ser percebido na espada de São Jorge.
Além disso, Ogum
representa a capacidade do ser humano de controlar a natureza e utilizá-la para
o benefício de todos. Por conta dos metais, Ogum passou a ser associado à guerra,
desviando seu papel de comandante das atividades agrícolas para a atividade
bélica e passando a ser o “Vencedor das demandas”.
Tendo como elementos
centrais a guerra e a metalurgia, Ogum, ferreiro e guerreiro, pode ser
associado ao deus romano da guerra, Marte, que tem como correspondente Ares, o deus
grego, o vingador, assim como com Vulcano e Hefesto, respectivamente os deuses romano
e grego do fogo, que possuíam a arte de forjar o ferro.
Acompanhado por Éris
(Discórdis), Deimos (Terror), Phóbos (Medo) e Enio (Devastadora), Ares,
proveniente da Trácia, norte grego, apresentava-se com lança, capacete e armadura
em suas batalhas, levando a morte a e destruição por onde passava. Associado ao
movimento, ao ferro, ao vermelho e à coragem, Ares pode nos revelar as “forças
primitivas, instintivas e selvagens em luta com forças atuantes na
consciência”, cuja energia decorrente se relaciona diretamente com a competição
e a vontade de seguir em frente, lutando e vencendo as batalhas.
.
Já com Vulcano/Hefesto, o
ourives divino, o simbolismo do artesão, que forja o ferro utilizando o fogo
dos vulcões, ou seja, a energia desprendida do inconsciente pode representar a
união concreta e abstrata entre arte e técnica20. A libido (vulcão) se
manifesta para a realização das ações e vivência plena, concretizadas nos
objetos criados a partir da manipulação e transformação dos metais, expressão
de uma “erupção” de ideias e potencialidades mágicas que equivalem à evolução
da tecnologia no intuito de dominar, comandar, desbravar e punir.
·.
Através da mitologia dos
Orixás africanos, podemos perceber algumas semelhanças entre as divindades
greco-romanas citadas anteriormente e Ogum, o grande guerreiro e manipulador dos metais.
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