sábado, 8 de março de 2014

A NOSSA FAMÍLIA




Sem uma correta compreensão da importância da família fica muito difícil nos ajustarmos a ela, quaisquer que sejam as bases desse ajuste. Além de ser o núcleo fundamental da sociedade encarnada, a família é para todos nós a primeira escola, o primeiro hospital; uma representação em escala menor da sociedade de um modo geral. Se não aprendermos a administrar nossos conflitos no seio da família, dificilmente o faremos no relacionamento interpessoal da comunidade humana.

O Espiritismo, que temos usado como diretriz fundamental para o presente texto, nos esclarece com muita propriedade que existem duas concepções distintas de família: a família terrena, constituída pelos parentes ligados pelos laços consanguíneos, e nem sempre afins, no que diz respeito às tendências e aptidões, e a família espiritual. Esta sim, formada pelos Espíritos afinizados, que possuem semelhança de gostos, de formas de entender a vida, ligados, em última análise, por laços afetivos que remontam a encarnações passadas.

Sendo a Terra, mais exatamente a esfera física de existência, o ponto de encontro de Espíritos de variadas categorias espirituais, nada mais lógico que a família represente o comitê de recepção do reencarnante disposto a um estágio na carne.

A família terrena, criada e mantida pelos laços do sangue, constitui o esforço de regeneração espiritual de um grupo de seres que normalmente programam com antecedência, ainda na Espiritualidade, o seu reencontro com o objetivo de se ajustarem, de se entenderem, a partir dos vínculos familiares e graças ao esquecimento do passado. Nesse novo contexto existencial, os Espíritos envolvidos em processos de resgate ou reparação de faltas mútuas, beneficiados pelo amortecimento das lembranças do passado e assim, na condição de pais e filhos, reiniciam a reeducação espiritual conjunta, quase sempre em ambiente de conflito.

É comum encontrarmos pela vida a fora pessoas com quem nos damos muito bem. Algumas parecem ser mais parentes que aqueles que nos aguardam em casa. De fato o são. São parentes espirituais, constituem membros de nossa família espiritual, sempre muito mais ampla que a família terrena. Esses entes, espiritualmente queridos, reencarnam cada um de acordo com as próprias necessidades evolutivas, mas a misericórdia divina nos concede a bênção do reencontro no tempo certo, para restabelecimento do convívio e alívio das angústias geradas pelas experiências do cotidiano.

Muitos daqueles que constituem nossa família espiritual não reencarnam ao mesmo tempo e permanecem como nossos “anjos da guarda”, nossos amigos espirituais, que farão todo o possível para que tenhamos sucesso em nossa passagem pela Terra. Muitas vezes, durante o sono do corpo, nos encontraremos com eles para troca de idéias e aconselhamento.

Percebe-se então que não podemos esperar a felicidade completa na vida familiar estabelecida pelos laços físicos. Essa família, aliás, se extingue com a morte do corpo, com cada um retornando ao seu habitat espiritual específico. Ainda assim, é essencial entendermos que a família terrena não se constitui por acaso. Seremos levados a conviver com as pessoas certas, no lugar certo e na hora certa, não sendo aconselhável fugir aos nossos compromissos de aprendizado mútuo.

Em cada família - é fácil observar - existem aqueles que se dão relativamente bem, aqueles que funcionam como verdadeiros esteios espirituais, e aqueles que parecem nada ter a ver com o grupo. Estão ali quase na condição de estranhos no ninho.

Muitas vezes são, realmente, Espíritos sem grandes ligações do passado, mas que contam com a nossa colaboração e compreensão para progredirem ao nosso lado. Serão fatores de constantes desequilíbrios, de conflitos e preocupações, pois são como crianças, ainda aprendendo o abc da convivência. Com eles os mais adiantados espiritualmente poderão exercitar as virtudes já conquistadas e adquirir outras, mesmo que ao preço de muito sofrimento e desgaste. Quanto a esses aprendizes da vida, aprenderão pelo exemplo, mais que através de palavras e exortações. Normalmente, não são seres razoáveis, são pessoas de índole difícil, que sempre necessitarão de uma boa dose de tolerância e paciência.

Há no livro O Evangelho Segundo o Espiritismo, da autoria de Allan Kardec, um capítulo muito importante que trata justamente das questões de ordem familiar. Trata-se do capítulo XIV (Honra a teu pai e tua mãe). Nele são tratados vários assuntos que permanecem atualíssimos, principalmente a questão da ingratidão dos filhos e os laços de família.

Realmente, por mais que nossos pais tenham errado conosco, sempre merecerão pelo menos o respeito devido a qualquer ser humano, e o amparo na velhice. No entanto, quantas vezes a intimidade gerada pelo convívio leva a desatinos com conseqüências previsíveis, espiritualmente falando.

Violência física e verbal entre os membros da família quase sempre são indícios de que o propósito da reencarnação em conjunto não está atendendo aos objetivos esperados. Soma-se a isso as influencias de adversários invisíveis, que nada mais querem que ver o circo pegar fogo e teremos um prognóstico sombrio para todos os envolvidos.

Nunca se pode esquecer que os pais de hoje também já foram crianças e adolescentes. Foram jovens com sonhos e esperanças.

Casaram-se em atendimento às suas necessidades espirituais, receberam outros Espíritos como filhos e vivem como podem, fazendo o que podem. Ao notarmos seus erros de conduta ou no processo educacional adotado na família, após uma análise mais madura da situação com um mínimo de envolvimento emocional, concluiremos que somos vítimas de vítimas. Nossos pais, por sua vez, também não tiveram uma educação muito boa e, além disso, como Espíritos, trazem suas virtudes e más tendências a evidenciarem-se no convívio diário.

Ainda há muito por fazer no aperfeiçoamento da instituição familiar. Os candidatos a pais deverão pensar um pouco mais nas responsabilidades de constituir família e, enquanto filhos, procurar entender os próprios pais, reconhecendo neles seres em evolução, com a diferença meramente circunstancial de terem reencarnado antes deles, tendo sempre em mente que não devemos esperar a felicidade completa na Terra, apenas momentos e eventos felizes.

O presente capítulo tem por título: Família - a casa e o lar. Há alguma diferença? Sim, há muita diferença. A maioria das pessoas ligadas por laços de consanguinidade têm uma casa e não um lar. A casa é meramente a estrutura física que nos abriga das intempéries. É onde nos reunimos para fazer as refeições, repousar, providenciar os cuidados com o corpo e retomar nossos afazeres. Poucos têm um lar. O lar implica a existência de um componente afetivo que se reflete na própria psicosfera doméstica. Se costuma dizer que até os animais de estimação refletem o estado do ambiente; mansos e tranquilos se o ambiente é espiritualmente saudável; inquietos e agressivos se ocorre o contrário. Deixamos a cargo do leitor comprovar a procedência ou não desse dito popular, mas ele não é de todo ilógico.

Cabe dizer, que a felicidade na Terra, com todo o seu relativismo, é conquista pessoal. É possível ser feliz dentro de certos limites. Contudo, a felicidade, qualquer que seja sua concepção, será sempre uma construção pessoal, dependente de nosso amadurecimento interior. Isso exige uma compreensão mais ampla da vida e o estabelecimento de um código de conduta compatível com nossa vivência pessoal, além de tempo. 
















LIVRO  ADOLESCENTE, MAS DE PASSAGEM
(Um ensaio espírita sobre a adolescência e a juventude)

Paulo R. Santos

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